quarta-feira, 28 de setembro de 2011

para uma pessoa de carne-osso-vida-amores.

Certas coisas poderiam ser ditas de maneira mais elaborada à medida que o texto seja lido e revisado algumas vezes, mas acredito que algumas escritas precisam ser registradas justamente como vieram à mente...ácidas, puras, cheias de verbos, pontos...e dispostas a deixar perguntas ao invés de respostas prontas, como gostam muitos desses jornais e programas sensacionalistas (que se acham última moda em questão de divulgas a notícia ao mundo). 
Ela morreu.........sim, morreu.          
Vieram à tona milhares de relatos e justificativa para um ato que mais parecia destino, sina, fatal para percorre um caminho “sem volta”, “perverso”, “imaturo”, quase uma “rebelde sem causa” a mulher morta que divulgou a imprensa.      
E antes mesmo de sabermos quem é essa mulher (não só respondendo à pergunta com um nome de batismo completo...), o que cantava, o que diziam essas músicas, o que eram suas letras, com que fúria rasgava seus papéis quando gritava de ódio, qual era a tinta que registrava um coração rasgado e amassado de uma mulher dilacerada, qual a dose que deixa a situação mais aveludada, é o álcool, é o crack, é a maconha, quando chora, quando sofre...o que se faz? Quem se chama? Ela canta? Ela canta....ela canta pra exorcizar os demônios, afastar a dor, aprumar a alegria que faz ficar em pé....o que fez a mulher gritar, rasgar...escrever..arder...cheirar...cair...rasgar a pele, cortar o coração e colocar-se de fora pra dentro..com os órgãos a mostra toda vez que canta seu luto..."back to black"....que canta seu luto e faz todos nós cremos que é aquela voz também pode cantar o meu, o seu, o luto de todos nós, todos nós que já perdemos um amor, deixamos as rédeas escorrerem entre os dedos.
Antes que olhássemos isso e muito mais em uma pessoa que teve sua morte friamente anunciada em todos os meios de comunicação, fomos observando as manifestações vigentes, reflexos de sinceras “coisificações”, generalidades....brutalidades...“morreu a diva.....desequilibrada, sofrida, mas sempre podendo cantar seu sofrimento”.
Quem de nós aqui nessa humanidade é equilibrado o suficiente pra dizer sobre o semelhante que se esfarela?...deixa-se dissolver lentamente no mundo das drogas.... O que representa o uso da droga na vida de uma pessoa? E na vida dessa pessoa de que falamos especificamente?...porque é disso que estamos falando! De uma pessoa de verdade! Com carne, ossos, tatuagens brutas, viscerais, cabelos espetados, olhos sessentistas, dentes em falta, saltos finos, pernas quase quebráveis... Se é pra falar do pó, da erva ou do que quer que seja, que se fale de uma pessoa! Que viveu uma vida....traçou um caminho e história...que nem sempre foram regados à festas, drinques, misturas efusivas e perigosas....e que tudo isso fez parte de um caminho, de uma rota...por algum motivo que escapa dos tablóides ansiosos pelos bons números que irão render essa morte quase glamurosa.    
O que eu sei é que há sempre algum motivo de vida, de morte, de ser....que escapa a nossa tentativa de explicar o que é uma vida e como ela merece ser experienciada. Não morre uma voz...morre um ser....morre um modo de estar e compor o percurso de todos que se sentem identificados com os lutos...."back to black"...com as lágrimas....com os amores estraçalhados no meio dos caminhos.
Morrer um ídolo é morrer alguém que disse por nós...disse em nome da Ana, da Maria, do José e do João.... quem chama hoje essa mulher de ídolo sabe disso?..esses jornais que dão-se por direito a chance de falar de roupas, vícios, tropeços, amarguras e amores de uma jovem mulher...encontrar os profissionais especializados pra dizer os motivos racionais, cartesianos de tanto álcool, tanta droga, muito amor doentio, e pouca reabilitação.
Quando eu morrer alguém vai preocupar-se em discorrer sobre todas as teorias possíveis e imagináveis do porquê das minhas manias, gestos, vozes, amizades, amores, alegrias e mágoas? ........................eu espero que não. Mas com Amy eu já vi acontecendo hoje.


(no dia da morte de Amy Winehouse)

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