Tentou
esticar-se ainda deitada em sua cama, estava pouco menos que empedrada. A
tensão de cada fibra muscular exigia maior criatividade para descobrir como se
mexer ainda naquele estado entorpecido, estranho, novo. Lembrou-se de como foi
difícil chegar até lá e que últimos dias tinham rendido pequenas memórias invisíveis,
latejantes. O calor dos lençóis era
dolorido ainda. Era um jeito gostoso de descobrir quantas células desconhecidas
havia no seu corpo.
Na falha tentativa de colocar pé ante pé com o corpo ainda inclinado na cama, percebeu como é orquestrada a exigência muscular para botar o corpo em mínimos movimentos. Deixou, assim, a gravidade vencer a batalha de deixar deitado seu corpo, ou que restava dele. Ficou aproveitando o poder de seu corpo, paralisando-o em todos os pequenos cantos de si.
A própria textura denunciava onde a rigidez de seus pedaços extrapolava os limites da pele, chegando aos dedos frios. Há algum tempo seus dedos também se encontravam assim, tal como os pés, essas primeiras pequenas extremidades a sofrer com o nervosismo das situações que explicitam a tensão da menina, semi-mulher, quiçá mulher-semi menina, quem sabe.
Reparou ainda deitada a bagunça de seus fios de cabelo, a falta de capricho com o acabamento das unhas, a importância de se tirar bem a maquiagem todos os dias, exercitar-se com freqüência, o alto (e bom?) preço das coisas pras quais a gente se joga literalmente de corpo inteiro, e aproveitou para entender o tempo de que seu corpo necessita para se assimilar as tantas, e tantas, vivências pelas quais ele passa todos os dias. Abandoná-lo agora seria tanto desamor, tanto. Deixou-se envolver consigo mesma como se aquilo fosse um ato de amor, então.
Achou curiosa a possibilidade da dor causar arrepios ainda, ou no mínimo, risos frouxos, o riso fazia parte dos pequenos movimentos que ainda eram possíveis naquele instante. Qual é o limite de uma dor? Em cada canto de si poderia haver uma possibilidade de resposta, mas não havia resposta pras ações que antecedem o pensamento. Era possível acreditar em ambigüidades. Há espaço para ambigüidades em vidas que não se entregam à surpresa de haver tanta possibilidade de viver? A dor também era um prazer. Ambigüidades.
Há vida que não se esgota. Há corpo que não se suporta. Dolorido agora era também não saber a inexatidão do tamanho de si, e essa dor também era boa de permanecer, trazendo aos olhos um corpo que há tempos grita: “Ei, eu estou aqui, olha pra mim”. Mais ambigüidades.
Latejava. Latejava. Latejava algo mais que as fibras musculares. Latejava uma pequena flor querendo nascer de uma semente seca, com vergonha do calor que roubaria do sol para nascer, das águas dos rios para beber, das cores que, ao nascer em si, seriam capazes de competir com o arco- íris nascendo após chuva em pleno verão. Lembrou-se, então, a linda e insistente tarefa da semente, segundo o autor preferido: “a semente ensina a não caber em si”. Pequenos espasmos musculares indicavam a hora de levantar-se.
O braço conseguia erguer as mãos, para que elas pudessem mexer os cabelos cacheadamente desordenados, a pele alva guardava alguns reflexos dos raios da manhã, e a gravidade foi sendo vencida com calma , sem a pressa desse mundo. Sentiu que acontecia um pequeno resgate de partes de si, dispersas como mudos fogos de artifício no chão. Os pedaços começavam a ser contagiados pelo impulso inicial, provocando cada célula, lada a lado.
Devagar, a água foi estragando o cachos, acabando com o drama da semente e, ao misturar-se com a essência preferida, lavanda, dava uma nova fragrância àquele corpo, como em sinal de bondade, gentileza. A paz que lhe restava foi surgindo da água esquentando o corpo, simulando o calor vermelho dos lençóis.
Deixou o contágio do vermelho seguir invisível: traçou os lábios como em movimento de pinta-los, admirando a semente que ajudara a cuidar.
Caiu uma lágrima, mistura de solidão, vermelho permanecendo, semente crescendo. Essas coisas de “tem que não ter cabimento pra crescer”.
Deixou-se permanecer em toalha felpuda na cadeira da varanda. Era bonito ver o sol laranja de outono compor com o vermelho dos lençóis.
Tomou seu café, sozinha.
Na falha tentativa de colocar pé ante pé com o corpo ainda inclinado na cama, percebeu como é orquestrada a exigência muscular para botar o corpo em mínimos movimentos. Deixou, assim, a gravidade vencer a batalha de deixar deitado seu corpo, ou que restava dele. Ficou aproveitando o poder de seu corpo, paralisando-o em todos os pequenos cantos de si.
A própria textura denunciava onde a rigidez de seus pedaços extrapolava os limites da pele, chegando aos dedos frios. Há algum tempo seus dedos também se encontravam assim, tal como os pés, essas primeiras pequenas extremidades a sofrer com o nervosismo das situações que explicitam a tensão da menina, semi-mulher, quiçá mulher-semi menina, quem sabe.
Reparou ainda deitada a bagunça de seus fios de cabelo, a falta de capricho com o acabamento das unhas, a importância de se tirar bem a maquiagem todos os dias, exercitar-se com freqüência, o alto (e bom?) preço das coisas pras quais a gente se joga literalmente de corpo inteiro, e aproveitou para entender o tempo de que seu corpo necessita para se assimilar as tantas, e tantas, vivências pelas quais ele passa todos os dias. Abandoná-lo agora seria tanto desamor, tanto. Deixou-se envolver consigo mesma como se aquilo fosse um ato de amor, então.
Achou curiosa a possibilidade da dor causar arrepios ainda, ou no mínimo, risos frouxos, o riso fazia parte dos pequenos movimentos que ainda eram possíveis naquele instante. Qual é o limite de uma dor? Em cada canto de si poderia haver uma possibilidade de resposta, mas não havia resposta pras ações que antecedem o pensamento. Era possível acreditar em ambigüidades. Há espaço para ambigüidades em vidas que não se entregam à surpresa de haver tanta possibilidade de viver? A dor também era um prazer. Ambigüidades.
Há vida que não se esgota. Há corpo que não se suporta. Dolorido agora era também não saber a inexatidão do tamanho de si, e essa dor também era boa de permanecer, trazendo aos olhos um corpo que há tempos grita: “Ei, eu estou aqui, olha pra mim”. Mais ambigüidades.
Latejava. Latejava. Latejava algo mais que as fibras musculares. Latejava uma pequena flor querendo nascer de uma semente seca, com vergonha do calor que roubaria do sol para nascer, das águas dos rios para beber, das cores que, ao nascer em si, seriam capazes de competir com o arco- íris nascendo após chuva em pleno verão. Lembrou-se, então, a linda e insistente tarefa da semente, segundo o autor preferido: “a semente ensina a não caber em si”. Pequenos espasmos musculares indicavam a hora de levantar-se.
O braço conseguia erguer as mãos, para que elas pudessem mexer os cabelos cacheadamente desordenados, a pele alva guardava alguns reflexos dos raios da manhã, e a gravidade foi sendo vencida com calma , sem a pressa desse mundo. Sentiu que acontecia um pequeno resgate de partes de si, dispersas como mudos fogos de artifício no chão. Os pedaços começavam a ser contagiados pelo impulso inicial, provocando cada célula, lada a lado.
Devagar, a água foi estragando o cachos, acabando com o drama da semente e, ao misturar-se com a essência preferida, lavanda, dava uma nova fragrância àquele corpo, como em sinal de bondade, gentileza. A paz que lhe restava foi surgindo da água esquentando o corpo, simulando o calor vermelho dos lençóis.
Deixou o contágio do vermelho seguir invisível: traçou os lábios como em movimento de pinta-los, admirando a semente que ajudara a cuidar.
Caiu uma lágrima, mistura de solidão, vermelho permanecendo, semente crescendo. Essas coisas de “tem que não ter cabimento pra crescer”.
Deixou-se permanecer em toalha felpuda na cadeira da varanda. Era bonito ver o sol laranja de outono compor com o vermelho dos lençóis.
Tomou seu café, sozinha.
#organicamente orgulhoso!
ResponderExcluirOh, menina, vc fala ao coração da alma! Lindo, perfeito! Beijos!
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