.delicando desvios.
quinta-feira, 27 de dezembro de 2012
Para a Rua.
Não gosto de recomendar...mas sugiro que leia ao som de "todalegria", do pessoal da Rua do Absurdo (que espero com fé ouvir pessoalmente em Récife em 2013)
sons que conversam com meu lado de dentro.
Qual o tamanho das horas?
Quantas horas se passaram desde a última vez em que cílios se juntaram nos olhos, em movimentos de dormir?
O tamanho dos minutos que passaram de ontem até agora podem ser o tamanho de uma hora... as horas ficaram morando nos últimos minutos em que tentei transformar os lençóis amassados em lugar de repouso.
Fico achando que o corpo está pedindo outros modos de descanso...menos previsíveis. “Queremos lugares alegres de descanso”
Cabeça, braços, pernas, vão se mexendo em compasso, provocando o sono que se acha descanso.
”Cadê você que quer parar? Acho que precisa encontrar a paz no movimento..”
Deitar e dormir parece ser previsível.
Vou me convencendo do contrário à força, fazendo a cadência orquestrada de movimentos se aquietar, ficar mansa.
”Você precisa dormir”.
Afirmações carregadas de pontos finais e da obrigação moral de cumprir todos os compromissos com os quais fui ficando envolvida durante a semana..uma semana...duas vou várias semanas.
Quando estava quase em movimentos de desistir, deixar o corpo ficar se debatendo, lençol amassando...encontro algumas melodias, sons em forma de provocação...provocações que vão atingindo o corpo sincronicamente em níveis celulares...célula após célula, todas vão se rendendo às alegrias ensurdecedoras de estarem embaladas por um som que se houve na rua, na madrugada. Som da Rua.
Cada pequena nota convoca cada pequena célula ao movimento do sono, com pausas para letras, e antes que o silencio escandaloso invadisse os pequenos poros, vou até o papel.
Pequenos pedaços palpáveis de insônia se dissolvem na madrugada.
Dissolvendo o sono, remexendo o inconsciente....sono, sonho e melodias vão se misturando no corpo que começa a se acalmar.....inventando ser Rainha da Bateria, curando feridas na Ortopedia, alcançando o timbre mudo do grito.
O sono vai sorrindo devagar, entrando pra página 6 de uma memória que vai borrando limites, fronteiras...
Os cílios se juntam novamente, enfim.
Toda alegria é surda.
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
É tempo de sagitário
O mergulho começou há alguns dias. As roupas modelando um corpo que se esvazia
desse alimento que preenche uma máquina movida por uma energia que não se vê. A
fome e a fartura estão na encruzilhada do surreal: não é isso que move meu ser
em movimento agora, hoje, esses dias.
O que move esse pedaço é o mesmo que provoca essa paralisia. Posso comer para andar, posso comer para ficar. Fico imóvel nas minhas composições celulares, que estão mergulhadas nessas escolhas que elas nunca fazem. Nascem sabendo, nascem fazendo, morrem fazendo e repetem-se ao longo da história de corpos misturados ao meu.
A densidade da fumaça confunde os limites do lar, os da rua, dessa paisagem da rua cheia junto ao peito cheio dessa cidade. Viramos parceiros a compor nossas invisibilidades no campo urbano da cidade.
O meu drama é o drama urbano. Muito existir em espaços misturados, apertados em algum lugar, frouxo em outros, e todos em tons de alguma cor que suponho encontrar todos os dias, nas mesmas árvores, nas mesmas ruas a atravessar.
Você, você que cruza o meu caminho todos os dias, certamente sabe de mim o mesmo tanto que eu mesma sei nesse momento: tenho um contorno de carne, roupas, guarda chuva nas mãos, bolsa no colo e caminho em passos cadenciados pela grande massa a se molhar, secar no resguardo de suas esperanças de uma boa semana com feriado pela frente. Intervalo para secar o suor da testa, como o lavrador dos campos, com quem posso tecer aproximações sobre uma vida possível e imaginária.
Encontrando uma discussão árdua a respeito da pensão alimentícia, velando o sono da trabalhadora provavelmente de idade menos avançada que a minha, vendo a fome de um pequeno menino, olhando as roupas da moça que certamente chama-se Patrícia, parar em frente ao muro na saída do metrô Sumaré, pensar no verde da cidade, na companhia do casal, no dinheiro que custa trabalhar, no outro que se ganha trabalhando, na casa onde se pode estar, no corpo onde se quer morar, na estranha lógica que divide bancos verdes e azuis no metrô, pensar em quem decide por fim à vida nos trilhos, imaginar o que separa esses pensamentos da insanidade, pensar que ela..de alguma pequena, ou imaginária forma, já começou nessas linhas.
As mãos no pescoço sustentam o cansaço de uma vida que se esgota nos números da cidade: há como pensar em presenças e ausências em um território cheio de vazios cheios? O meu vazio encontra-se feliz na cidade de São Paulo.
Muitas vidas em um dia. Todos os dias são uma vida completa, nascendo e morrendo. Suando e secando. Chorando e rompendo. Olhando você nascer de novo. Gosto que você morra um pouco por dia, vou esperando as suas novas folhas vingarem mais esperançosas em outras cores. Gosto de confabular que inventaremos novos lugares, cores, presenças, ausências, mais permeáveis. Posso estar só. Posso estar com um milhão. Estou com você. Estou com ninguém. Estou sozinha, enfim.
As insanidades formando um terreno brando, sob o qual fica doce caminhar. O conforto fica no departamento dos invisíveis por um mundo que se abre e fecha a cada dia. Compreendo melhor você atravessar a cidade na chuva para ficar estarrecido diante de uma obra de arte, deixar-se molhar pelos pingos furiosos de água de procedência natural duvidosa, andar por uma hora com pés inesgotavelmente cansados para sentir o cheiro do seu café preferido, passar horas em pé esperando o seu lugar preferido para sentar-se em uma mesa na livraria, esperar ser atendido pelo funcionário que sabe de forma íntima e satisfeita a respeito de seus gostos literários, ir até a casa de um amigo no meio da madrugada, feliz, rindo, entorpecido pela vida que o chama.
Não é só durante a noite que todos os gatos podem parecer pardos.
A vida pode parecer parda a qualquer hora do dia.
O sem nome das ausências não se sabe de que vão formando buracos poderosos, que colocam medos nas criancinhas a acompanhar os olhares fixos dentro de um minuto que encontram na rua a andar, andar, andar. São muitas criancinhas, jovens, velhos, em todo esse lugar. Onde cabem os buracos dessa gente toda? Onde elas guardam suas presenças? Quero andar também por esses terrenos, que sinto estarem logo ao lado. Ou no mesmo lugar onde já estou andando há dias, meses, algumas vidas.
Troco a vontade de gritar por um “obrigada!” ao garçom do bar, o ficar parado no meio do lado esquerdo da escada rolante por um sorriso ao casal de velhos que olha minha bravura em ceder lugar aos corpos há mais tempo nesse mundo que o meu.
Sou um pouco eu, é um pouco todo mundo. Todo o mundo está dentro da minha respiração acelerada, mãos trêmulas, esboços de sorrisos e choros desmedidos. Todo mundo está um pouco comigo ruminando meus infernos dessa composição astral que me cabe.
Hoje é como se todos dentro de mim tivessem nascido em 25 de Novembro.
E estivessem puxando os cabelos devagar, escorregando as unhas pelo pescoço pelado.
Brindando no meio da rua suas alegrias, derramando lágrimas compulsivas a respeito de uma vida. De um conhecimento. De vários desconhecimentos. De tantos buracos. De tanta gente que fica, que vai embora...acena de costas e não olha pra trás.
”Vá, mas não olhe para trás...é com essa imagem que você fica se cogitar olhar”, diz Fannis, no memorável “O Tempero da Vida”.
A chuva acabou, dando indícios do fim das lágrimas, do final da compulsão literária.
Os astros mudam de posição, ditam o fim das linhas.
É tempo de sagitário.
O que move esse pedaço é o mesmo que provoca essa paralisia. Posso comer para andar, posso comer para ficar. Fico imóvel nas minhas composições celulares, que estão mergulhadas nessas escolhas que elas nunca fazem. Nascem sabendo, nascem fazendo, morrem fazendo e repetem-se ao longo da história de corpos misturados ao meu.
A densidade da fumaça confunde os limites do lar, os da rua, dessa paisagem da rua cheia junto ao peito cheio dessa cidade. Viramos parceiros a compor nossas invisibilidades no campo urbano da cidade.
O meu drama é o drama urbano. Muito existir em espaços misturados, apertados em algum lugar, frouxo em outros, e todos em tons de alguma cor que suponho encontrar todos os dias, nas mesmas árvores, nas mesmas ruas a atravessar.
Você, você que cruza o meu caminho todos os dias, certamente sabe de mim o mesmo tanto que eu mesma sei nesse momento: tenho um contorno de carne, roupas, guarda chuva nas mãos, bolsa no colo e caminho em passos cadenciados pela grande massa a se molhar, secar no resguardo de suas esperanças de uma boa semana com feriado pela frente. Intervalo para secar o suor da testa, como o lavrador dos campos, com quem posso tecer aproximações sobre uma vida possível e imaginária.
Encontrando uma discussão árdua a respeito da pensão alimentícia, velando o sono da trabalhadora provavelmente de idade menos avançada que a minha, vendo a fome de um pequeno menino, olhando as roupas da moça que certamente chama-se Patrícia, parar em frente ao muro na saída do metrô Sumaré, pensar no verde da cidade, na companhia do casal, no dinheiro que custa trabalhar, no outro que se ganha trabalhando, na casa onde se pode estar, no corpo onde se quer morar, na estranha lógica que divide bancos verdes e azuis no metrô, pensar em quem decide por fim à vida nos trilhos, imaginar o que separa esses pensamentos da insanidade, pensar que ela..de alguma pequena, ou imaginária forma, já começou nessas linhas.
As mãos no pescoço sustentam o cansaço de uma vida que se esgota nos números da cidade: há como pensar em presenças e ausências em um território cheio de vazios cheios? O meu vazio encontra-se feliz na cidade de São Paulo.
Muitas vidas em um dia. Todos os dias são uma vida completa, nascendo e morrendo. Suando e secando. Chorando e rompendo. Olhando você nascer de novo. Gosto que você morra um pouco por dia, vou esperando as suas novas folhas vingarem mais esperançosas em outras cores. Gosto de confabular que inventaremos novos lugares, cores, presenças, ausências, mais permeáveis. Posso estar só. Posso estar com um milhão. Estou com você. Estou com ninguém. Estou sozinha, enfim.
As insanidades formando um terreno brando, sob o qual fica doce caminhar. O conforto fica no departamento dos invisíveis por um mundo que se abre e fecha a cada dia. Compreendo melhor você atravessar a cidade na chuva para ficar estarrecido diante de uma obra de arte, deixar-se molhar pelos pingos furiosos de água de procedência natural duvidosa, andar por uma hora com pés inesgotavelmente cansados para sentir o cheiro do seu café preferido, passar horas em pé esperando o seu lugar preferido para sentar-se em uma mesa na livraria, esperar ser atendido pelo funcionário que sabe de forma íntima e satisfeita a respeito de seus gostos literários, ir até a casa de um amigo no meio da madrugada, feliz, rindo, entorpecido pela vida que o chama.
Não é só durante a noite que todos os gatos podem parecer pardos.
A vida pode parecer parda a qualquer hora do dia.
O sem nome das ausências não se sabe de que vão formando buracos poderosos, que colocam medos nas criancinhas a acompanhar os olhares fixos dentro de um minuto que encontram na rua a andar, andar, andar. São muitas criancinhas, jovens, velhos, em todo esse lugar. Onde cabem os buracos dessa gente toda? Onde elas guardam suas presenças? Quero andar também por esses terrenos, que sinto estarem logo ao lado. Ou no mesmo lugar onde já estou andando há dias, meses, algumas vidas.
Troco a vontade de gritar por um “obrigada!” ao garçom do bar, o ficar parado no meio do lado esquerdo da escada rolante por um sorriso ao casal de velhos que olha minha bravura em ceder lugar aos corpos há mais tempo nesse mundo que o meu.
Sou um pouco eu, é um pouco todo mundo. Todo o mundo está dentro da minha respiração acelerada, mãos trêmulas, esboços de sorrisos e choros desmedidos. Todo mundo está um pouco comigo ruminando meus infernos dessa composição astral que me cabe.
Hoje é como se todos dentro de mim tivessem nascido em 25 de Novembro.
E estivessem puxando os cabelos devagar, escorregando as unhas pelo pescoço pelado.
Brindando no meio da rua suas alegrias, derramando lágrimas compulsivas a respeito de uma vida. De um conhecimento. De vários desconhecimentos. De tantos buracos. De tanta gente que fica, que vai embora...acena de costas e não olha pra trás.
”Vá, mas não olhe para trás...é com essa imagem que você fica se cogitar olhar”, diz Fannis, no memorável “O Tempero da Vida”.
A chuva acabou, dando indícios do fim das lágrimas, do final da compulsão literária.
Os astros mudam de posição, ditam o fim das linhas.
É tempo de sagitário.
terça-feira, 21 de agosto de 2012
Para Arnaldo Antunes.
Tô dando folga pros neurônios
pra lembrar que também tenho o resto do corpo
quem sabe o que pode trazer esse novo descanso?
um novo batalhão menos diposto ao trampo
mudar essa sina, de todo dia
”usar, queimar, vir novo neurônio e vingar”
Tá vindo a chance dessa revolta celular
mandando os pés mandarem mais
o vento nos cabelos o caminho poder indicar
os olhos poderem escolher para onde querem olhar
o sorriso nascer assustado ao se deparar com a questão neural:
”o que você está fazendo nesse rosto, afinal?”
e ele, largo, responder:
"estou sorrindo assim, mais sossegado”
Tô pagando pra ver até onde isso vai dar.
pra lembrar que também tenho o resto do corpo
quem sabe o que pode trazer esse novo descanso?
um novo batalhão menos diposto ao trampo
mudar essa sina, de todo dia
”usar, queimar, vir novo neurônio e vingar”
Tá vindo a chance dessa revolta celular
mandando os pés mandarem mais
o vento nos cabelos o caminho poder indicar
os olhos poderem escolher para onde querem olhar
o sorriso nascer assustado ao se deparar com a questão neural:
”o que você está fazendo nesse rosto, afinal?”
e ele, largo, responder:
"estou sorrindo assim, mais sossegado”
Tô pagando pra ver até onde isso vai dar.
terça-feira, 14 de agosto de 2012
Diadorim e Riobaldo, e sem seu paletó amassado.
Dou-lhe chamegos em número par
vontade ímpar de minhas pernas ali deixar
se você ficar
faço dois terços a mais de caldo
leio o romance doido de Diadorim e Riobaldo
se você ficar
deixo a cama feita
pele cheirosa
vestido no cabide
se você ficar
não choro no seu paletó passado
nem deixo sua camisa em linho amassado
se você ficar
vai ser só sofrimento
doido tormento
vela a queimar
reza a rezar
promessa pra você em outra não grudar
se você ficar
tormento
se você ficar
tormento
se você for embora
o que de mim irá restar?
se você ficar
resto eu sem resto de nada
não
se você for, eu ficar, você lá ficar
resto eu com resto de tudo.
sexta-feira, 20 de julho de 2012
Eu sei, não é assim
Por enquanto eu só consigo lembrar-me de que era ela, estranhamente, a única pessoa a acertar a temperatura da água do meu banho no inverno, do meu café de todos os dias e de todas as outras bebidas geladas também. Sua mão era gelada, o coração muito quente...
Lembro, com menos vivacidade, porém, a bela maneira dessa mulher protestar contra meus ataques doentios de ciúme em resposta à leveza dos tecidos que revelavam não só suas belas pernas, como também a beleza reticente de suas coxas.
Desculpas.
Não vou ver importância na falta de corte dos seus cabelos, em suas unhas por fazer ou na infeliz combinação de cores das suas roupas. Você sempre diz fazer isso, mas eu, sinceramente, nada vejo. E por isso também peço desculpas.
Perdão, perdão.
Por ficar calado, estarrecido, diante das maiores desgraças no continente africano e ter frenesi verbal a respeito do último lançamento da Apple.
Desculpe-me pelos elogios por fazer, a louça a lavar e as pendências de vida que eu não consegui desenvolver junto ao hare krishna na esquina da Rua Augusta com a Avenida Paulista.
Eu não entendo nada a respeito dos maus espíritos, agouros, energias não vibrantes que você espantava com cheiros de incenso, mas, por amor, por favor, peço que me deixe impregnado com esse cheiro agora. Até, até que enfim, eu vomite todo esse modismo de escrever cartas com o qual você me enfeitiçou.
Eu prometo.
Eu prometo respeitar todos os seus oráculos como se fosse eu mesmo quem os tivesse ouvido. Há rumores de que eles sussurram todas as noites em seus ouvidos.
Mas, também, é nesse bando de espírito que eu vou me agarrar se você não voltar. Você vai voltar?
Vou falar mais baixo, as letras estão pulando em você.
Prometo não engasgar mais com seu perfume, reclamar menos do cheiro das suas flores e também usar menos o meu carro. Serei freqüentador assíduo do metrô em prol da camada de ozônio. Eu tenho inveja do amor que você sente pela camada de ozônio.
Terei grande prazer no esforço em afrouxar meu quadril para seguir sua dança neste lugar de tanta música.
Prometo até fingir grande eloqüência ao falar sobre o conflito étnico dos curdos, a respeito da presença dos judeus na Palestina ou sobre o “Bra- Burning”. Falarei como se fosse uma das grandes vítimas.
Discutirei todas as cenas de cinema europeu que você desejar e silenciarei após seu choro descabido ao ver repetidamente todos os filmes do Truffaut.
Velarei mais seu sono ao invés de querer mais sexo ardente.
Peço desculpas por, talvez, ter este tamanho (pequeno?) de homem perto da imensidão que você parece ser.
Eu sei, não é assim...
mas deixe-me acreditar que se eu tivesse feito tudo diferente, você voltaria.
quinta-feira, 12 de julho de 2012
Chama-se algo sobre descobrir que se tem um corpo
Tentou
esticar-se ainda deitada em sua cama, estava pouco menos que empedrada. A
tensão de cada fibra muscular exigia maior criatividade para descobrir como se
mexer ainda naquele estado entorpecido, estranho, novo. Lembrou-se de como foi
difícil chegar até lá e que últimos dias tinham rendido pequenas memórias invisíveis,
latejantes. O calor dos lençóis era
dolorido ainda. Era um jeito gostoso de descobrir quantas células desconhecidas
havia no seu corpo.
Na falha tentativa de colocar pé ante pé com o corpo ainda inclinado na cama, percebeu como é orquestrada a exigência muscular para botar o corpo em mínimos movimentos. Deixou, assim, a gravidade vencer a batalha de deixar deitado seu corpo, ou que restava dele. Ficou aproveitando o poder de seu corpo, paralisando-o em todos os pequenos cantos de si.
A própria textura denunciava onde a rigidez de seus pedaços extrapolava os limites da pele, chegando aos dedos frios. Há algum tempo seus dedos também se encontravam assim, tal como os pés, essas primeiras pequenas extremidades a sofrer com o nervosismo das situações que explicitam a tensão da menina, semi-mulher, quiçá mulher-semi menina, quem sabe.
Reparou ainda deitada a bagunça de seus fios de cabelo, a falta de capricho com o acabamento das unhas, a importância de se tirar bem a maquiagem todos os dias, exercitar-se com freqüência, o alto (e bom?) preço das coisas pras quais a gente se joga literalmente de corpo inteiro, e aproveitou para entender o tempo de que seu corpo necessita para se assimilar as tantas, e tantas, vivências pelas quais ele passa todos os dias. Abandoná-lo agora seria tanto desamor, tanto. Deixou-se envolver consigo mesma como se aquilo fosse um ato de amor, então.
Achou curiosa a possibilidade da dor causar arrepios ainda, ou no mínimo, risos frouxos, o riso fazia parte dos pequenos movimentos que ainda eram possíveis naquele instante. Qual é o limite de uma dor? Em cada canto de si poderia haver uma possibilidade de resposta, mas não havia resposta pras ações que antecedem o pensamento. Era possível acreditar em ambigüidades. Há espaço para ambigüidades em vidas que não se entregam à surpresa de haver tanta possibilidade de viver? A dor também era um prazer. Ambigüidades.
Há vida que não se esgota. Há corpo que não se suporta. Dolorido agora era também não saber a inexatidão do tamanho de si, e essa dor também era boa de permanecer, trazendo aos olhos um corpo que há tempos grita: “Ei, eu estou aqui, olha pra mim”. Mais ambigüidades.
Latejava. Latejava. Latejava algo mais que as fibras musculares. Latejava uma pequena flor querendo nascer de uma semente seca, com vergonha do calor que roubaria do sol para nascer, das águas dos rios para beber, das cores que, ao nascer em si, seriam capazes de competir com o arco- íris nascendo após chuva em pleno verão. Lembrou-se, então, a linda e insistente tarefa da semente, segundo o autor preferido: “a semente ensina a não caber em si”. Pequenos espasmos musculares indicavam a hora de levantar-se.
O braço conseguia erguer as mãos, para que elas pudessem mexer os cabelos cacheadamente desordenados, a pele alva guardava alguns reflexos dos raios da manhã, e a gravidade foi sendo vencida com calma , sem a pressa desse mundo. Sentiu que acontecia um pequeno resgate de partes de si, dispersas como mudos fogos de artifício no chão. Os pedaços começavam a ser contagiados pelo impulso inicial, provocando cada célula, lada a lado.
Devagar, a água foi estragando o cachos, acabando com o drama da semente e, ao misturar-se com a essência preferida, lavanda, dava uma nova fragrância àquele corpo, como em sinal de bondade, gentileza. A paz que lhe restava foi surgindo da água esquentando o corpo, simulando o calor vermelho dos lençóis.
Deixou o contágio do vermelho seguir invisível: traçou os lábios como em movimento de pinta-los, admirando a semente que ajudara a cuidar.
Caiu uma lágrima, mistura de solidão, vermelho permanecendo, semente crescendo. Essas coisas de “tem que não ter cabimento pra crescer”.
Deixou-se permanecer em toalha felpuda na cadeira da varanda. Era bonito ver o sol laranja de outono compor com o vermelho dos lençóis.
Tomou seu café, sozinha.
Na falha tentativa de colocar pé ante pé com o corpo ainda inclinado na cama, percebeu como é orquestrada a exigência muscular para botar o corpo em mínimos movimentos. Deixou, assim, a gravidade vencer a batalha de deixar deitado seu corpo, ou que restava dele. Ficou aproveitando o poder de seu corpo, paralisando-o em todos os pequenos cantos de si.
A própria textura denunciava onde a rigidez de seus pedaços extrapolava os limites da pele, chegando aos dedos frios. Há algum tempo seus dedos também se encontravam assim, tal como os pés, essas primeiras pequenas extremidades a sofrer com o nervosismo das situações que explicitam a tensão da menina, semi-mulher, quiçá mulher-semi menina, quem sabe.
Reparou ainda deitada a bagunça de seus fios de cabelo, a falta de capricho com o acabamento das unhas, a importância de se tirar bem a maquiagem todos os dias, exercitar-se com freqüência, o alto (e bom?) preço das coisas pras quais a gente se joga literalmente de corpo inteiro, e aproveitou para entender o tempo de que seu corpo necessita para se assimilar as tantas, e tantas, vivências pelas quais ele passa todos os dias. Abandoná-lo agora seria tanto desamor, tanto. Deixou-se envolver consigo mesma como se aquilo fosse um ato de amor, então.
Achou curiosa a possibilidade da dor causar arrepios ainda, ou no mínimo, risos frouxos, o riso fazia parte dos pequenos movimentos que ainda eram possíveis naquele instante. Qual é o limite de uma dor? Em cada canto de si poderia haver uma possibilidade de resposta, mas não havia resposta pras ações que antecedem o pensamento. Era possível acreditar em ambigüidades. Há espaço para ambigüidades em vidas que não se entregam à surpresa de haver tanta possibilidade de viver? A dor também era um prazer. Ambigüidades.
Há vida que não se esgota. Há corpo que não se suporta. Dolorido agora era também não saber a inexatidão do tamanho de si, e essa dor também era boa de permanecer, trazendo aos olhos um corpo que há tempos grita: “Ei, eu estou aqui, olha pra mim”. Mais ambigüidades.
Latejava. Latejava. Latejava algo mais que as fibras musculares. Latejava uma pequena flor querendo nascer de uma semente seca, com vergonha do calor que roubaria do sol para nascer, das águas dos rios para beber, das cores que, ao nascer em si, seriam capazes de competir com o arco- íris nascendo após chuva em pleno verão. Lembrou-se, então, a linda e insistente tarefa da semente, segundo o autor preferido: “a semente ensina a não caber em si”. Pequenos espasmos musculares indicavam a hora de levantar-se.
O braço conseguia erguer as mãos, para que elas pudessem mexer os cabelos cacheadamente desordenados, a pele alva guardava alguns reflexos dos raios da manhã, e a gravidade foi sendo vencida com calma , sem a pressa desse mundo. Sentiu que acontecia um pequeno resgate de partes de si, dispersas como mudos fogos de artifício no chão. Os pedaços começavam a ser contagiados pelo impulso inicial, provocando cada célula, lada a lado.
Devagar, a água foi estragando o cachos, acabando com o drama da semente e, ao misturar-se com a essência preferida, lavanda, dava uma nova fragrância àquele corpo, como em sinal de bondade, gentileza. A paz que lhe restava foi surgindo da água esquentando o corpo, simulando o calor vermelho dos lençóis.
Deixou o contágio do vermelho seguir invisível: traçou os lábios como em movimento de pinta-los, admirando a semente que ajudara a cuidar.
Caiu uma lágrima, mistura de solidão, vermelho permanecendo, semente crescendo. Essas coisas de “tem que não ter cabimento pra crescer”.
Deixou-se permanecer em toalha felpuda na cadeira da varanda. Era bonito ver o sol laranja de outono compor com o vermelho dos lençóis.
Tomou seu café, sozinha.
terça-feira, 19 de junho de 2012
.verde com azul.
à cor do vinho que nos embedou em pleno agosto, achando ser verão, por tanto calor, tanto fogo;
à cor dos olhos esbofeteados pela noite transcedental, cheia de braços, abraços, luxúria;
à cor da minha boca, nesse frio em que você me abandonou por encontrar também outras bocas roxas de vinho, e achar nelas o roxo da uva mais nobre da safra. E daquele líquido desejar viver como que a vida inteira ainda;
à cor dos olhos roxos de tanto chorar, de chorar a porta batendo e você pegando seu violão, livros, quadros e contas a pagar;
porque a vida, meu amigo, não acontece sem que haja a cor roxa.
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